Apesar de ter sido desenvolvido para a raça Nelore, o protocolo pode ser adaptado e aplicado a outras raças.
Já está à disposição dos produtores rurais o Protocolo Embrapa +Precoce P14, ou simplesmente, P14. A tecnologia possibilita trabalhar com fêmeas bovinas da raça Nelore, com idade entre 12 e 16 meses de idade e com índices adequados de fertilidade e produtividade. O novo processo produtivo foi desenvolvido por uma equipe multidisciplinar de pesquisadores da Embrapa, formada por melhoristas, nutricionistas e especialistas em reprodução e sanidade animal.
A precocidade é um dos mais importantes parâmetros de escolha para melhoria da qualidade da carne e de eficiência de sistemas de produção de bovinos de corte, porque além de ampliar a taxa de prenhez, acelera o alcance de peso corporal no início da idade reprodutiva.
“Após quatro anos de experimentos, validações na Embrapa e em fazendas comerciais, e trocas com especialistas, conseguimos fechar esse protótipo de protocolo, com indicações genéticas, reprodutivas, nutricionais, de manejo e sanitárias voltadas à precocidade sexual de novilhas. Os resultados mostram que as fêmeas bovinas conseguiram ser emprenhadas na primeira estação de monta após a desmama, ao redor dos 14 meses, sem afetar o desempenho produtivo”, explica Eriklis Nogueira, pesquisador em reprodução da Embrapa Pantanal (MS). A recomendação é para propriedades com certo nível de tecnificação, sistema produtivo de cria e situadas nos biomas Cerrado e Mata Atlântica, principalmente. Apesar de ter sido desenvolvido para a raça Nelore, o protocolo pode ser adaptado e aplicado a outras raças.
Também atuando em reprodução animal na Unidade de Corumbá, a pesquisadora Juliana Corrêa reforça que “a precocidade é uma característica unânime nos diferentes setores de produção relacionados à pecuária de corte. Assim há interesse em adiantar a entrada das fêmeas na idade reprodutiva e, consequentemente, no ciclo produtivo, seja pela produção de bezerros ou de carne”. Em sistemas intensificados, a pesquisadora ratifica que a precocidade potencializa os índices produtivos, aumentando a arroba produzida por hectare.
Além do aumento na taxa de prenhez, a adoção do P14 indica o alcance de peso corporal de, no mínimo, 260 kg no início da estação reprodutiva, e de cerca de 400 kg no parto de primíparas (fêmea que teve seu primeiro parto). Isso representa um ganho de peso diário de 0,425 kg, do início da primeira estação reprodutiva ao parto (330 dias), garantindo crescimento adequado sem impactar na produção desses animais ao longo da vida.
Para nulíparas (novilhas que não pariram ainda), a estação reprodutiva é de 60 dias, entre os meses de novembro e janeiro; e para as primíparas precoces, a estação é de 60 a 90 dias, entre outubro e janeiro. Dessa forma, o novo processo produtivo busca, no mínimo, 35% de taxa de prenhez na primeira IATF (inseminação artificial por tempo fixo) e superior a de 50%, no fim da primeira estação reprodutiva.
Rodrigo Gomes, nutricionista da Embrapa Gado de Corte (MS), afirma que esses números são metas mínimas desejáveis para o protocolo, mas alerta que “o desempenho reprodutivo é fortemente dependente do ambiente e, portanto, o alcance total das metas não pode ser plenamente garantido”.
O que disseram os experimentos
Entre 2020 e 2023, os pesquisadores avaliaram dois rebanhos da raça Nelore nas dependências da Embrapa Gado de Corte, sendo um composto por animais puro por origem (Nelore PO) e outro sem registro por associação de raça. As fêmeas foram submetidas a duas inseminações, sem repasse com touro.
Após passarem por todo o Protocolo Embrapa +Precoce P14 – nutrição, reprodução, genética e sanidade – as taxas de prenhez finais variaram de 51,6% a 65,8% ao final da estação reprodutiva, ou seja, dentro das metas propostas pelo novo protocolo.
Dando continuidade aos testes, o P14 foi levado a fazendas comerciais em Mato Grosso do Sul, produtoras de animais com Certificado Especial de Identificação e Produção (CEIP). Entre os resultados obtidos, destacou-se o peso na desmama de bezerros machos e fêmeas, filhos de primíparas, nas categorias precoce e convencional. Com 210 dias, tiveram peso na desmama de 163,6 kg e 173,1 kg, fêmeas e machos, respectivamente. Enquanto os das primíparas convencionais foram de 159,9 kg e 172,1 kg.
As taxas de prenhez e perdas gestacionais foram acompanhadas em quatro estações de monta consecutivas em duas propriedades rurais. Os estudos constataram que a média de prenhez nas duas IATFs foi superior a 40%, com resultado de 58,1%. As perdas foram, ao redor, de 7,6%.
Confira o passo a passo do novo protocolo:
Desmama
Para alcançar as metas previstas pelos pesquisadores, o primeiro ponto a ser observado é a desmama, dando prioridade a vacas com bom histórico materno (e também paterno) reprodutivo e de precocidade. Também devem ser selecionadas fêmeas geradas no início da estação de nascimento, completando 14 meses em novembro e dezembro, além daquelas com maior peso corporal na desmama.
“Essa etapa considera ainda o objetivo de peso de, pelo menos, 260 kg no início da estação de reprodução”, pontua Nogueira. Animais com aprumos (posicionamento correto) defeituosos, garupa angulada e chanfro (região dos ossos nasais) torto são descartados, a fim de não comprometer o desempenho do protocolo.
Manejo alimentar até a primeira estação reprodutiva
Por sua vez, o nutricionista Rodrigo Gomes frisa que o manejo alimentar considera a pastagem e a suplementação. Para a pastagem é recomendável definir a área três meses antes da desmama e optar por gramíneas como os capins marandu, piatã, coastcross ou tifton. Se possível, escolher uma área com solo bom em fertilidade, aplicando adubação nitrogenada ao final da estação das chuvas. O diferimento deve durar de 60 a 90 dias, geralmente entre fevereiro e março.
Para a suplementação alimentar, Gomes apresenta fórmulas de rações e considera três classes de animais com peso na desmama e respectivos ganhos de peso para atingir o objetivo de peso no início da primeira estação reprodutiva.
Tabela 1 – Matriz de relação entre peso na desmama, estratégia de suplementação mínima e ganho de peso médio (GMD) esperado.
*As estratégias de suplementação devem ser analisadas caso a caso por especialistas. Para o exemplo em questão, foram considerados os seguintes parâmetros: pastagem de Brachiaria brizantha cv. Marandu, com 8% de proteína bruta (PB), 55% de nutrientes digestíveis totais (NDT) e ingestão de matéria seca de 1,9 a 2,1% do PV (peso vivo), relação entre proteína degradável no rúmen (PDR) e PB>90%”, observa o pesquisador.
Manejo reprodutivo na primeira estação de monta
A pesquisa aponta soluções comuns para monta natural ou IATF. A primeira delas é pré-sincronizar (presinc) as fêmeas, utilizando progesterona injetável, dispositivos intravaginais liberadores de progesterona (1g), usados previamente, ou suplementação oral com acetato de melengestrol (MGA). Outra recomendação é vacinar contra doenças da esfera reprodutiva antes da estação de monta, sem esquecer a dose de reforço.
Na sequência, selecionar reprodutores que produzam bezerros mais leves ao nascimento e, por fim, a estação de reprodução deve ser programada para que os nascimentos ocorram entre setembro e outubro e, assim, evitar grande perda de condição corporal das fêmeas até a estação de monta seguinte.
Entre as indicações diferentes, na monta natural, por exemplo, a estação de monta deve ser curta, 60 a 90 dias, entre novembro e fevereiro, e o uso de touros mais novos e leves, de 2ª estação de monta, com peso corporal próximo de 600 kg e avaliados para baixo peso ao nascimento.
Especialista em reprodução, a médica veterinária Alessandra Nicacio, da Embrapa Gado de Corte, avisa que as taxas de prenhez, com uso de monta natural (mesmo com a pré-sincronização), podem ser menores que as alcançadas quando se usa IATF, pois os protocolos de sincronização de ovulação podem induzir um estímulo maior sobre esses animais ainda em início de vida reprodutiva.
Figura 1 – Esquema do protocolo de indução hormonal de puberdade para IATF. CE = Cipionato de estradiol, PGF = Prostaglandina F2 α, BE= Benzoato de estradiol, eCG = Gonadotrofina Coriônica Equina, GnRH = Hormônio Liberador de Gonadatrofina, ESCT = Escore de remoção de tinta (1 – com tinta a 3 – sem tinta).
* 1ª dose de vacina reprodutiva para primovacinados ou reforço anual para animais vacinados ao maternal.
** 2ª dose de vacina reprodutiva para primovacinados.
Atenção: As doses hormonais devem ser seguidas conforme recomendação de um médico-veterinário credenciado.
A diferença do melhoramento genético
Para os pesquisadores da Embrapa, mesmo seguindo esse passo a passo, é primordial que o rebanho a ser manejado já apresente elevado desempenho reprodutivo, com taxa de prenhez superior a 75%.
Nesse caso, o melhorista da Empresa Gilberto Menezes comenta que os touros selecionados devem passar por avaliação genética, confirmando se estão aptos em relação ao potencial genético para fertilidade.
Critérios prioritários para a seleção de touros para utilização no Protocolo Embrapa +Precoce P14 (tabela 02)
Segundo Menezes, os mesmos procedimentos e critérios para a seleção de touros devem ser levados em consideração para as fêmeas. Contudo, para as fêmeas, é recomendável aquelas que tenham maior profundidade de costela e maior espessura de gordura subcutânea na garupa.
Apresentação do protocolo
O protocolo Embrapa +Precoce P14 está sendo apresentado à comunidade técnico-científica durante o Simpósio Repronutri, que acontece nos dias 12 e 13 de setembro, em Campo Grande, MS. O evento é um fórum de discussão, bianual, voltado às temáticas de reprodução, genética, produção e nutrição animal. A última edição presencial foi em 2019 e contou com mais de mil participantes.
Em sua sexta edição, o evento é realizado pela Embrapa, Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS), Universidade Católica Dom Bosco (UCDB), Uniderp, FertPlan, InovaGen Consultoria Veterinária, CIA Assessoria Agrícola e Pecuária, MelhoreAnimal Consultoria, Gênesis e Fundação de Apoio A Pesquisa Agropecuária e Ambiental (Fundapam).